quinta-feira, 22 de março de 2012

A EDUCAÇÃO NA OBRA DE JOHN LOCKE

Resumo
O texto apresenta, de forma simples, a caracterização do momento histórico e da vida do filósofo inglês John Locke, considerado um homem de seu tempo, engajado sempre com problemas contemporâneos ao seu momento histórico. O texto faz um recorte histórico acerca do modo como o pensamento revolucionário e ideias liberais lockianas influenciaram o mundo do conhecimento, da política e, especialmente para nós, a educação. Por isso, o trabalho enfatiza a sua abordagem relativa às questões da educação do chamado gentleman e sua preparação para o novo momento que se instaurava na Inglaterra após a Revolução Gloriosa em 1688. Ele compilou uma série de preceitos sobre aprendizado e desenvolvimento, com base em sua experiência de médico e preceptor, que teve grande repercussão nas classes emergentes de seu tempo.



Palavras-chave: John Locke. Empirismo. Educação.


Abstract
The text shows, in very simple words, the characterization of the historical moment and life of the English philosopher John Locke, who was considered a contemporary man. A man who was always engaged to the events of his time. The text develops a line about the way the revolutionary thoughts and lockian ideas influenced the world of knowledge, politics, and specially for us, the education. That is the reason why this paper emphasizes the approach towards the educational matters concerning to what was called gentleman and his preparation to the new moment he was supposed to face in England after Glorious Revolution in 1688. He compiled his ideas and beliefs in learning and development based on his own experience as a physician and tutor, which let into a huge repercussion among the emergent societies of his time.



O Momento Histórico

Encontramos no início do século XVI, a real situação econômica da Inglaterra bastante próspera, por causa da política mercantilista, comércio de manufaturas, como também, a pirataria apoiada pelo trono inglês. Essa atmosfera termina por fortalecer e enriquecer a burguesia, que passa a fortalecer-se também em outras partes da Europa e a exercer forte influência em todo o território, sendo assim, o absolutismo dos Tudor era voltado para os interesses burgueses. Este forte laço de interesses entre a Coroa e os comerciantes acontecia devido a algumas concessões da Coroa, como o monopólio do comércio. Por outro lado, os burgueses acabavam retribuindo esta concessão com o apoio financeiro e político às decisões da coroa. Os Tudor mantinham a sua hegemonia com aparências de governo popular e quando intencionados a tomar uma decisão recorriam à formalidade para obter a aprovação parlamentar. Temos então, um período no qual o poder político era exercido pela Coroa. Era o auge do absolutismo na Inglaterra. Em 1603, com a morte de Elizabeth I, termina o período da dinastia Tudor, possibilitando um novo período na política e na economia inglesas.
No século XVII, o cenário muda, pois a burguesia, cada vez mais fortalecida, questionara os poderes reais. A partir de uma reformulação na economia e no comércio, surge uma “Nova Burguesia”, dedicada ao setor manufatureiro, em contraposição ao mercantilismo. Existe uma razão para essa mudança de interesses – o crescimento em números da burguesia, impossibilitando que a monarquia garantisse os privilégios e interesses do comércio exterior para todos, mas apenas de uma minoria cada vez mais privilegiada, provocando o descontentamento e a mudança de interesses, iniciando assim uma série de conflitos em série entre os burgueses representados pelo parlamento e a autoridade da coroa inglesa. Outro aspecto que não pode ser esquecido neste período histórico diz respeito às religiões e seus interesses na economia e na política. Todos tentavam utilizar a religião como veículo de divulgação e expressão dos seus interesses. A Igreja Anglicana, originária da elite da nobreza e dos setores mais ligados à coroa britânica, era predominante no poder, tomando partido dos interesses absolutistas que a beneficiava. Por outro lado, os católicos, que também tinham suas origens na nobreza feudal, apesar de não compactuar com a centralização dos poderes apenas na realeza, defendiam o absolutismo, com medo de perderem certos favores e direitos adquiridos com os privilégios feudais. Os calvinistas, mesmo se dividindo em dois grupos – os presbiterianos e os puritanos, que eram de origem burguesa –,faziam oposição ao absolutismo. A partir das mudanças econômicas e políticas ocorridas na Inglaterra no início do século, o absolutismo inicia uma crise; por conseguinte, a disputa dos interesses em jogo atinge também o parlamento inglês.
Como já é sabido, Locke vem de uma família de burgueses comerciantes e é influenciado pelas ideias revolucionárias da época e, especialmente, as ideias do pai. A situação na Inglaterra era bastante conturbada por causa da política de imposição de interesses religiosos adotada por Carlos I. Logo, no ano de 1640, começa uma guerra civil na Inglaterra, motivada pela tentativa de Carlos I em dissolver o Parlamento Inglês. Ao lado de Carlos I, ficaram os católicos e anglicanos, formando o exercito monarquista, ou dos “cavaleiros”. O exército das forças contrárias aos cavaleiros era chamado de “cabeças redondas”, defensores do parlamento, formado por presbiterianos e puritanos das camadas mais humildes. Seguiram sete anos de luta, os “cabeças redondas” venceram. Logo após, julgaram e executaram o monarca Carlos I, suprimiram a monarquia e proclamaram a República na Inglaterra, a chamada Commonwealth. O pai de Locke havia adotado a causa dos puritanos e tinha se alistado no exército do Parlamento, saindo vencedor na guerra.



O Homem John Locke

Nasceu em Wrington, no sudoeste da Inglaterra em uma aldeia no ano de 1632. Ele era filho de burgueses e pequenos proprietários de terras. Foi um verdadeiro artesão do pensamento político liberal que não apreciava a matemática. Estudou na escola de Westminster e aos 20 anos entra em Oxford, que seria sua casa por mais de 30 anos. Lá direcionou os estudos para as ciências naturais e a medicina, porém os estudos tradicionais da universidade não o satisfaziam, mas aplicou-se. Não gostou da filosofia ensinada em Oxford. Mais tarde, julgou como patética a filosofia Aristotélica. Foi admitido na Sociedade Real de Londres - a academia científica no ano de 1668, para estudar medicina. Graduou-se seis anos depois, entretanto sem o título de doutor. Um fato interessante na vida de Locke aconteceu dois anos antes, pois em 1666, quando o lorde Anthony Ashley-Cooper, futuro conde de Shaftesbury, precisou de cuidados médicos, foi atendido por John Locke. No ano seguinte, mostrando que não havia esquecido o estudante que o atendera, Anthony tornou Locke seu conselheiro para questões de saúde, política e economia. Por influência de Ashley, Locke ajudou a elaborar a Constituição do estado norte americano da Carolina. Depois de uma temporada na França, o filósofo foi chamado por Ashley a assumir um cargo de conselheiro no governo do rei Carlos II. Uma reviravolta política afastou ambos do poder. Com medo da perseguição que sofria, Locke fugiu para a Holanda apenas retornando para a Inglaterra em 1688, após o restabelecimento do protestantismo. Com a subida ao poder do rei William III de Orange, Locke foi nomeado ministro do Comércio, em 1696. Ficou neste cargo até 1700, onde precisou sair por motivo de doença. Em seus últimos anos, viveu no campo, perto de Oates, e foi mentor intelectual do Partido Liberal. Locke nunca se casou, ou mesmo, teve filhos. Morreu praticamente só aos 72 anos em 1704 de causas naturais.


Um Filósofo Empirista

Locke encontra-se entre os filósofos empiristas, desta forma chamados pelo fato de abrirem espaço para a ciência junto à filosofia, considerando a experiência como fonte de conhecimento. Destaca-se pela sua teoria das ideias e também pela luta em defesa da legitimidade da propriedade, parte integrante da sua teoria social e política. Para Locke, o direito de propriedade é a base da liberdade humana. Para ele todo homem tem uma propriedade que é sua própria pessoa. O governo existe para proteger esse direito do homem a existir.

O filósofo inglês era atraído pelos tópicos tradicionais da filosofia: o eu, o mundo, Deus e as bases do conhecimento. Foi contemporâneo de Thomas Hobbes, porém, diferente deste, era liberal e com convicções parlamentaristas. Locke começava assim a colocar em prática sua filosofia política. Suas ideias que constituíram a democracia liberal e que teriam forte influência nas décadas seguintes. Muitas delas estão presentes nas constituições dos Estados Unidos e do Reino Unido, e durante muito tempo na constituição francesa. Esses pensamentos fizeram a base de sua obra-prima, o Ensaio sobre o entendimento humano. Locke também foi contemporâneo de cientistas, como Galileu Galilei e Isaac Newton, de quem se tornou amigo e chegou a trocar várias cartas, nas quais conversavam sobre os astros e ideias religiosas. O pensamento de Locke reflete a revolução em andamento na ciência naqueles anos. O pensamento liberal de Locke se mostraria ainda mais ousado com a publicação em 1689 da obra Dois tratados sobre o governo civil. Nela, o pensador mostra como o consentimento voluntário do povo é o único fundamento da autoridade de um governo. Para o filósofo qualquer um, mesmo uma autoridade, que excedesse o poder a ele conferido pela lei e que fizesse uso da força para tomar ou invadir, poderia ser ferido pelo outro e mesmo ser morto como qualquer homem que mediante força viole o direito de outro. Para Locke, o governo deveria agir somente com o objetivo de proteger a vida, a liberdade e a propriedade.
Como eu já citei algumas linhas acima foi enorme a influência da obra de Locke e suas tão famosas teses, estão na base das democracias liberais. No século XVIII, os iluministas franceses foram buscar em suas obras as principais ideias responsáveis pela Revolução Francesa. Montesquieu (1689-1775) inspirou-se em Locke para formular a teoria da separação dos três poderes. A mesma influencia encontra-se nos pensadores americanos que colaboraram para a declaração da independência americana em 1776.



Sobre a linha do desenvolvimento do empirismo, Locke representa um progresso em confronto com os seus precedentes: no sentido de que as ideias dos mesmos se limitavam a nos oferecer, filosoficamente, uma teoria do conhecimento, mesmo considerando a metafísica tradicional, e do senso comum no que diz respeito a Deus, à alma, à moral e à religião. Com relação à religião natural, não muito diferente do deísmo abstrato da época, porquanto é baseada na razão. John Locke defende a tolerância e o respeito às religiões particulares, históricas e positivas.
Nas suas viagens pela França, o filósofo ampliou o seu horizonte cultural, assim como, teve contato com movimentos filosóficos diversos, em especial com o racionalismo. Tornou-se mais consciente do seu empirismo, que procurou completar com elementos racionalistas. As suas obras filosóficas mais notáveis são: o Tratado do Governo Civil (1689); o Ensaio sobre o Intelecto Humano (1690); os Pensamentos sobre a Educação (1693). Os dois últimos marcam as reflexões contidas neste texto.


Origem das ideias

Como a proposta do meu texto é refletir sobre os aspectos educacionais na obra de Locke e inseri-lo dentro dos acontecimentos históricos do seu tempo, não discorrerei aqui sobre os tipos de ideias de sensação e reflexão, nem tão pouco, irei, em tão breves e imaturos pensamentos, tentar discorrer sobre a classificação estrutural das ideias para Locke.
Pontuo que a maior preocupação de Locke em sua teoria do conhecimento foi combater a doutrina disseminada por Descartes - da existência de ideias inatas na mente do homem. Para o pensador John Locke, a mente humana era como uma folha de papel em branco que receberia impressões através dos sentidos a partir das experiências do indivíduo, sem trazer consigo do nascimento, quaisquer ideias tais como a de "extensão", de "perfeição", da “verdade” e outras, como pretendia Descartes. Para o nosso filósofo em questão, todas as ideias vêm ou da experiência de sensação ou da experiência de reflexão. A mente capta e traduz o mundo exterior.
Na educação, compilou uma série de preceitos sobre aprendizado e desenvolvimento, com base em sua experiência de médico e tutor, que teve grande repercussão nas classes emergentes de seu tempo.


Fins práticos para a educação

Frases de John Locke a respeito da educação:

"Os homens são bons ou maus, úteis ou inúteis, graças a sua educação". "Um espírito são em um corpo são é uma descrição breve, porém completa, de um estado feliz neste mundo".

Locke defendia o ponto de vista de que a educação devia ter fins práticos, de preparar o indivíduo para a vida, e não para ser um intelectual de vida acadêmica. Suas obras Thoughts concerning Education ("Pensamentos sobre a Educação") e Conduct of the Understanding ("Condução do Conhecimento") são muito recomendadas quando se trata da história da filosofia educacional. Nos livros, Locke enfatizou o valor da experiência no desenvolvimento da mente, todavia, ele desconsidera, de forma extremista, as diferenças genéticas.
Por esse motivo que para Locke o aprendizado depende das informações e experiências às quais a criança vivencia e que ela absorve de modo natural. Entendemos então, que é um aprendizado de fora para dentro, muito diferente do que defenderam alguns pensadores de linha idealista, como o suíço Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) e Johann Heinrich Pestalozzi (1746-1827), como também para um vasto número de teóricos da educação, como por exemplo, os de concepção construtivista para os quais o conhecimento institui-se com base na relação entre sujeito e objeto, enquanto a visão lockiana enfatiza apenas o objeto. Embora considerasse que a origem de todas as ideias estava fora do indivíduo, Locke via a capacidade de entendimento como inata e variável de pessoa para pessoa.
O Ensaio sobre o Entendimento Humano tem como fundamentos iniciais a negação da existência de ideias inatas – confrontando o legado do filósofo mais influente do período, o francês René Descartes (1596-1650) e o princípio de que todas as ideias nascem da experiência, em outras palavras, o empirismo. A educação adquiria, desta forma, importância incontornável na formação da criança, uma vez que, sozinha, ela se encontra desprovida de matéria-prima para o raciocínio e sem orientação para adquirir essa experiência, estando fadada ao egocentrismo e à ignorância moral. Apesar do valor que dava à racionalidade, Locke era cético quanto a atingir a compreensão da mente. O objetivo de sua obra principal foi tentar determinar quais são os mecanismos e os limites da capacidade de apreensão do mundo pelo homem.

Sobre a formação do tal cavalheiro

No livro Alguns Pensamentos Referentes à Educação, Locke fala da facilidade de moldar a alma de uma criança e levá-las numa ou noutra direção, como fazemos com a água. Formar um aluno, sob o aspecto intelectual ou moral, seria exclusivamente um resultado do trabalho das pessoas que os educam - pais e tutores, para quem caberia acima de tudo, dar o exemplo de como pensar e agir, treinando a criança para se comportar de maneira adequada. O aprendizado deveria ser feito por meio de atividades. A ideia era que a criança, pelo hábito, inferisse o que está fazendo. Para Locke, a educação ideal seria promovida em casa, por um mentor, papel que ele próprio desempenhou para os filhos de alguns amigos. Locke tinha em mente o homem burguês, aqueles que seriam os futuros governantes. A conduta e a ética do gentleman, incluindo as boas maneiras exerciam papel de destaque na educação. A saúde e a disciplina do corpo também ganharam bastante atenção porque Locke ensinava certo endurecimento físico visando à disciplina.

Conclusão

Locke acreditava que as crianças vêm ao mundo sem nenhum conhecimento, mas já trazendo inclinações e principalmente um temperamento. O mestre, que em nossos dias é chamado educador, deveria observar as características emocionais do aluno para submetê-lo a diferentes técnicas de aprendizado. Mesmo que as concepções de conhecimento do filósofo estejam parcialmente ultrapassadas, essa é uma recomendação que ainda pode ser levada em conta.
Observamos em especial nas duas obras Alguns Pensamentos Referentes à Educação, como também, O Ensaio sobre o Entendimento Humano que John Locke deixa clara a necessidade de um modelo educacional voltado para a defesa das ideias e dos interesses da classe social a qual estava inserido – a burguesia. Uma classe que havia enfrentado desde os séculos XVI e XVII conflitos e revoluções em função da defesa de um objetivo – sua consolidação de poder junto à coroa inglesa. E este novo momento acaba sendo institucionalizado a partir da Revolução Gloriosa de 1688, que garantiu a substituição do absolutismo pela monarquia, a qual a monarquia ficava submetida ao parlamento.
A ascensão da burguesia demandava uma forma de educação diferenciada, em que os indivíduos recebessem uma devida preparação para que pudessem atuar facilmente em sociedade com o interesse de continuar levando adiante os desejos, necessidades e os ideais de sua classe. contudo, conseguiriam alcançar seus objetivos apenas se tivessem uma boa constituição física e moral, sendo assim explicada a preocupação de Locke com o processo educacional abrangente, que passava uma preocupação ímpar com cuidados com a saúde, alimentação, vestuário, hábitos, higiene, equilíbrio da mente, cuidado com a formação moral, influências, exemplos e, principalmente, o processo de disciplinamento. Somente uma preparação assim ampla garantiria o comportamento proveitoso do indivíduo na sociedade, garantindo o jogo de interesses entre monarquia e burguesia europeias.























Bibliografia


BURNS, Edward Mac Nall, LERNER, Robert E., MEACHAM, Standish. O absolutismo. In: História da Civilização Ocidental: do homem das cavernas as naves espaciais. 30.ed. Rio de Janeiro. Globo, 1989.

LOCKE, J. Ensaios acerca do Entendimento Humano (1960). In: Os Pensadores. São Paulo: Editora Abril Cultural, 1979.

LOCKE, J. Introdução Histórica à Filosofia da Ciência, São Paulo: Editora da
Universidade de São Paulo, 1979.
LOCKE, J. Alguns Pensamentos sobre da Educação, São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1978.

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